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21.8.06

Leituras gastronômicas #13

Um Cientista na Cozinha
texto adaptado de Attico Chassot

Já parou para pensar na histórica associação da química com a cozinha? Ou então já fez questionamentos sobre os fenômenos químicos relacionados com a conservação e o preparo de alimentos?

Se perguntas como: Por que cozinhar em panelas de cobre? Como recuperar talheres de prata?ou Por que utilizar colheres de pau? muito provavelmente não ocorrem entre nós nos dias atuais (porque o design das cozinhas e o metier dos cozinheiros e cozinheiras mudou muito neste final de século, que tornou as cozinhas de nossas avós dignas de museus), elas estão respondidas no livro junto com as freqüentes Por que a casca do pão tem mais sabor que o miolo? Por que o leite derrama? Por que a sopa esfria quando sopramos? Como misturar óleo com água? Por que a adição de limão ou vinagre fluidifica a maionese? Por que a gema cozinha depois da clara? Como evitar que os suflês afundem? e dezenas de outras perguntas que são explicadas, mostrando quais os fenômenos físicos e/ou químicos estão presentes em "Um cientista na cozinha" de Hervé This.

Há inclusive algumas mais técnicas entre as que estão muito presentes hoje nem nossas salas de aula: Por que se cozinha mais rapidamente com uma panela de pressão? ou Como ocorre o cozimento dos alimentos em um forno de microondas?

Estas até poderiam ser mais cientificamente explicadas no texto.
O livro não é uma coletânea de perguntas e respostas, como o parágrafo anterior poderia induzir a leitora ou o leitor a acreditar. Há, por exemplo, um capítulo sobre a nova fisiologia do gosto, que This inicia mostrando as concepções de Aristóteles para chegar às divagações modernas e revelações mais recentes da ciência sobre o tema, passando por preparados dos alquimistas -- e mostrando, por exemplo, a importância histórica da noz-moscada, fazendo-nos recordar como esteve presente nas cozinhas de nossa infância. As cores (e neste âmbito os cuidados para evitar determinados escurecimentos indesejáveis nos alimentos), os aromas e os perfumes tão importantes na sensibilização de nosso paladar são apresentados sob ótica culinária.

Alguns alimentos são contemplados com destaque: o ovo (segundo This "um astro pouco conhecido na cozinha"), a maionese, o pão, o leite (para este explica como a temperaturas superiores a 74°C átomos de enxofre reagem com íons de hidrogênio formando o sulfeto de hidrogênio, que percebemos no característico cheiro de leite fervido), as carnes. As bebidas merecem interessantes observações. Quando os vinhos são comentados, o autor nos convida aprender a ver com o nariz, explicando também como o glicerol forma as lágrimas dos vinhos. No capítulo sobre chás, o autor mostra porque certas chaleiras fazem com que o chá derrame usando uma ilustração do efeito de Bernouilli (que, enunciado em 1738, ainda hoje importante em concepções aerodinâmicas); já o texto sobre o vinagre frustra-nos, pois os vinagres balsâmicos, significativos no enriquecimento dos aromas de uma salada, são muito rapidamente mencionados.

Há ainda algo que merece destaque no livro: um cuidadoso glossário de palavras e expressões pouco usuais, entre estas ficamos conhecendo preciosismo da cozinha francesa. Para aqueles que têm formação em química, muitos termos deste glossário são dispensáveis ou poderiam ser mais completos, mas para um significativo número de leitores devem ter muita utilidade. Há também um extenso índice remissivo por assuntos e onomástico que facilita a consulta. Aquelas e aqueles que gostam de garimpar em notas de rodapé vão degustar muitas riquezas culinárias e históricas nas muitas e curiosas notas que o livro traz.

A quarta capa traz algumas questões que não passam de curiosidades de almanaque e podem, à primeira vista, tirar o crédito da obra: Como fazer 24 litros de maionese com uma única gema de ovo? ou Como transformar em poucos segundos uma mistura quente num sorvete saboroso? Os editores muito provavelmente acreditam -- e devem ter razão -- que estas perguntas vendem mais do que falar na capa das reações químicas que ocorrem nas panelas ou mostrar explicações culinárias através da reação de Maillard ou dizer como duas moléculas que tenham grupamentos amina se ligam a açúcares numa base de Schiff, composto que depois é transformado num produto de Amadori, como descreve o autor para mostrar o aroma de certos alimentos sápidos, isto é, saborosos.

Acredito que os leitores ligados à química, particularmente aquelas e aqueles ligados ao ensino, vão apreciar esta obra, e os que a detestam -- e sabemos que são muitos -- vão encontrar nela saborosos motivos para talvez até digerir ódio em amor.

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